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terça-feira, julho 20, 2004

O momento de decisão em biossegurança

Artigo de Valério Igor P. Victorino

Se a porta da ciência da vida está aberta, devemos adentrar com cuidado, pois algumas implicações podem ser irreversíveis, comprometendo a vida de milhões de pessoas no futuro
Valério Igor P. Victorino (igorvic@usp.br) é doutor em Sociologia pela USP e professor da Universidade do Vale do Itajaí, SC. Artigo enviado pelo autor ao ‘JC e-mail’:
‘Essa demora, aliada à incerteza da aprovação final, na medida em que o CNBS poderá vetar o licenciamento, segundo critérios de conveniência e oportunidade, poderá frustrar investimentos e atrasar o desenvolvimento de vários setores, inclusive do promissor setor de agronegócio.’ (O Projeto de Biossegurança e os transgênicos, in: Valor Econômico, 8/7/2004)
Quando li a matéria acima perguntei: A biotecnologia é a melhor alternativa para a agricultura? Ou é a mais lucrativa??
Quais interesses devem nortear a adoção de uma tecnologia que pode implicar em riscos de alguma natureza? A segurança dos testes em áreas de experimentação controlada pode ser mantida quando da liberação dos organismos geneticamente modificados na natureza?
A nova biotecnologia pode acelerar e induzir o processo de transformação da natureza simplesmente reduzindo o tempo do processo natural de emergência e extinção de espécies de vida no planeta.
Espécies de milho e soja que foram criadas espontaneamente em gerações imemoriais nos solos do México e da China, já se encontram sob ameaça por conta das novas biotecnologias.
É fato que os agricultores manipulam sementes há séculos. É fato que qualquer cultura agrícola implica em desmatamento e redução das espécies.
Os processos de expansão humana naturalmente já implicam em redução da biodiversidade. Contudo, não com a mesma potencialidade em termos de proporção e velocidade que somente a agricultura biotecnológica pode imprimir.
A vida não mais é fruto do acaso. O ideário do Iluminismo está em vias de realização com as experiências de controle da vida. Este é um poder muito grande para ser determinado por poucos interesses.
Principalmente por interesses ligados a capitais friamente materializados nos terminais das bolsas de valores, onde os operadores não são pagos para se importarem com as implicações das atividades das empresas que estão sendo negociadas.
É isto que está em jogo neste momento no Senado Federal. Quais interesses predominarão no desenvolvimento da moderna biotecnologia?
De um lado cientistas que imaginam que os riscos podem ser minimizados pelos benefícios e procuram acelerar o processo. Alguns destes cientistas acreditam que as possibilidades de controlar a vida emergirão simultânea e simetricamente com o controle ético.
Outros não se colocam questões éticas... Junto a eles encontram-se os homens da terra, agricultores de todo tipo: dos grandes produtores rurais até os índios Kaingangues.
Este segmento parece estar embriagado do poderoso destilado ideológico do lobby das corporações transnacionais (5 ou 6 que monopolizam a biotecnologia em escala global e estão atentas ao potencial agronômico do Brasil) que promete lucros consideráveis ou a simples ameaça de quebrar por não ter acompanhado a modernidade tecnológica.
De outro lado da arena estão pessoas informadas pelo potencial de riscos, articuladas em grupos ou não, que propõem maior precaução e reorientação desta tecnologia para interesses de maior significação dentro dos projetos de desenvolvimento nacional.
Mais uma porta do caminho da ciência foi aberta. Se a porta da ciência da vida está aberta, devemos adentrar esta porta com cuidado, pois algumas implicações podem ser irreversíveis, comprometendo a vida de milhões de pessoas no futuro.
A espécie humana se diferencia das outras espécies pela capacidade de discernimento: faculdade de julgar as coisas de modo claro e sensato. É a única espécie capaz de avaliar o seu próprio comportamento. Será muito terrível se as gerações futuras concluírem que a nossa geração poderia ter evitado erros...

Fonte: Jornal da Ciência

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